Recados da espiritualidade – Sidney Fernandes

RECADOS DA ESPIRITUALIDADE

Sidney Fernandes

1948@uol.com.br

         É uma doutrina, esta, dos anjos guardiães, que, pelo seu encanto e doçura, deverá converter os mais incrédulos.

 Allan Kardec, O Livro dos Espíritos

 

Genivaldo Barbosa herdara dos avós e dos pais o respeito pelos animais e pela natureza. Cuidava muito bem da propriedade rural, que era o seu ganha-pão e de seus irmãos. Vivia com a esposa e dois filhos em pequena gleba de terra, ao lado de mais dois irmãos, que também tinham seus sítios, lado a lado, com as respectivas famílias.Genivaldo e seus irmãos guardavam muito respeito pelas coisas de Deus.

Distantes da cidade, reuniam-se semanalmente para orar, juntos, no culto do evangelho no lar.Todos participavam, adultos, crianças e alguns empregados mais antigos, que eram considerados como da família. Até os fiéis cães de guarda ficavam rodeando o grupo, como se desfrutassem da harmonia daquele encontro ameno. Ao final de cada reunião as esposas apresentavam, orgulhosamente, o seu melhor quitute. A oração terminava com chá, bolo e muita conversa. As crianças esperavam ansiosamente pelo culto.

Os três sitiantes mantinham plantio para consumo próprio, mas viviam mesmo da cria, engorda e venda de gado bovino. Selecionavam rigorosamente os melhores bezerros, que futuramente iriam compor os novos rebanhos. Periodicamente levavam os animais para venda aos frigoríficos da região. Não eram preços elevados, mas compensavam os esforços das três famílias, que viviam muito bem. As crianças frequentavam a escola da cidade e tinham a saúde sob constante vigilância. Levavam vida modesta, mas com o necessário para proporcionar a todos segurança e conforto.

Eis que um dia, aparece na entrada do sítio um dos irmãos de Genivaldo. Vinha acompanhado de senhor muito bem vestido, que conduzia uma reluzente perua de última geração. Os Barbosa costumavam vender seus animais sempre juntos. E Genivaldo, irmão mais velho, era sempre consultado nos empreendimentos das três famílias. O irmão de Genivaldo trazia um comprador de animais que estava propondo valores bem superiores aos oferecidos pelos frigoríficos da região. Roberto Sales, esse era o nome do comprador, fizera uma boa oferta por suas reses. Achando que seus dois irmãos também poderiam se beneficiar do negócio, ali estava para apresentá-lo a Genivaldo.

Dali a pouco o outro irmão de Genivaldo chegava também, e pouco tempo depois chegaram a um acordo. Em algumas horas Roberto viria buscar os animais com um caminhão. Pedia prazo para os pagamentos. Deixaria, como garantia, alguns cheques a serem resgatados em datas futuras. Genivaldo estava um pouco preocupado. Alguma coisa, no íntimo, lhe dizia que precisariam analisar melhor o negócio. Afinal de contas, era o esforço de um ano de toda a família que estava em jogo. Não seria o caso de serem mais prudentes? Porém, os irmãos de Genivaldo acharam razoável a concessão do prazo, considerando que estavam fazendo excelente venda, já que a oferta era quase o dobro dos valores pagos pelos habituais compradores. E se não fechassem o negócio naquele momento, talvez Roberto fosse procurar outros sítios da região.

Estavam para bater o martelo na transação, quando entrou no recinto o pequeno Adolfo, menino de tez escura, neto de Anastácia, que servia a família desde a época do avô de Genivaldo.

— Tio Valdo. Vó Tácia quer falar com o senhor! – disse o menino com firmeza e desenvoltura.

— Diga a ela que estou terminando um negócio importante, mas em seguida irei à casa dela – respondeu Genivaldo, educadamente.

— Tio Valdo. Vó Tácia disse que tem que ser agora!

Genivaldo assustou-se. Vó Tácia convivia com sua família havia décadas. Tinha grande sensibilidade mediúnica. Era criatura generosa, discreta e comedida. Se estava mandando aquele recado tão veemente é porque era coisa séria. Pediu licença ao comprador e aos seus irmãos e foi ver o que estava acontecendo. Seguiu Adolfo, que o puxou com firmeza pela mão até Vó Tácia.

— Qual é o problema, Anastácia? – disse Genivaldo.

— Suspenda esse negócio, Tio Valdo! – advertiu Anastácia.

— O quê? Mas, pode me dizer o motivo? Essa venda vai nos trazer muitas vantagens!

— Tio Valdo vai perder todas as vaquinhas da família. Irmão Lupércio está aconselhando Tio Valdo a se informar melhor.

Genivaldo respeitava a mediunidade de Anastácia. Ela se entendia muito bem com Irmão Lupércio, protetor espiritual da família de Genivaldo. Essas manifestações não eram muito frequentes. Mas, de vez em quando, pela inspiração de Anastácia vinham recados muito precisos da espiritualidade. Voltando à reunião com o comprador e seus irmãos, Genivaldo informou que havia surgido um problema muito sério e teriam que suspender o negócio. Que Roberto voltasse em outro dia.

Os irmãos de Genivaldo, receando perder aquela excelente oportunidade, discordaram com veemência. Todavia, conheciam bem o irmão mais velho. Quando ele falava alguma coisa, merecia respeito.

No dia seguinte, logo na abertura da agência bancária da cidade, lá estavam os três irmãos, buscando informações de Roberto Sales junto ao gerente. Tiveram o cuidado de levar a placa do seu veículo. Em poucos instantes tinham a resposta. O carro pertencia a Roberto Almeida, nome verdadeiro do tal Roberto Sales, procurado pela polícia por estelionato. Costumava aplicar golpes em fazendeiros daquela região do estado, espalhando cheques sem fundos, apossando-se de seus animais.

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Naquela noite, a oração do culto do evangelho dos Barbosa foi de agradecimento pela proteção recebida.

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Indaga Allan Kardec na questão 524, de O Livro dos Espíritos:

As advertências de nossos Espíritos protetores têm por objeto único a conduta moral ou também a conduta a ter nas coisas da vida particular?

Respondem os Espíritos: — Tudo. Eles procuram fazer-vos viver o melhor possível. Mas, frequentemente, fechais os ouvidos às boas advertências, e sois infelizes por vossa causa.

Os Espíritos protetores nos ajudam com seus conselhos pela voz da consciência, que fazem falar em nós. Mas, como a isso não ligamos sempre a importância necessária, nos dão de maneira mais direta, servindo-se das pessoas que nos rodeiam. Que cada um examine as diversas circunstâncias, felizes e infelizes, de sua vida e verá que em muitas ocasiões recebeu conselhos que nem sempre aproveitou e que lhe teriam poupado desgostos se os houvessem escutado.

Allan Kardec, O Livro dos Espíritos

 

Narrativa baseada em fato real contada por João Eduardo Fabris, de Presidente Prudente.

Originally posted 2016-05-27 12:38:14.