Nenhum Mal é Digno de Comentário

Sidney Fernandes – 1948@uol.com.br

E por que atentas tu no argueiro que está no olho de teu irmão, e não reparas na trave que está no teu próprio olho?

Lucas, 6:41

Ressuscitar fatos negativos pode provocar desagradáveis consequências ao que desavisadamente comenta ou àquele que deliberadamente reverbera a maledicência.

— Nunca me conformo com a exumação de cadáveres…

Estas palavras foram ditas com bom humor por Jerônimo a André Luiz, durante importante operação socorrista na crosta terrestre. Referia-se o assistente ao cuidado que se deve ter com os erros e defeitos alheios, a serem relembrados somente para que sejam evitados. Divulgá-los e criticá-los é faltar com a caridade.

O princípio da indulgência foi pressentido pelos precursores do Cristo quinhentos anos antes do seu nascimento:

É disposição natural em todos nós a de nos apercebermos muito menos dos nossos defeitos, do que dos de outrem — já afirmava a Doutrina de Sócrates e de Platão, ideia cristã revivida e espalhada pelo Espiritismo.

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Sabidamente, tragédias que envolvem personagens notórios incitam comportamentos similares. São as chamadas desgraças em cluster ou em série. Wolfgang Von Goethe, em seu romance Os Sofrimentos do Jovem Werther, infelizmente provocou a emulação em muitas outras pessoas, que seguiram o triste exemplo do jovem alemão.

Quando comentamos o mal, atraímos o mal.

Um velório, por exemplo, deveria ser ambiente de respeito e de conversações discretas. Muitos dos presentes contam anedotas, falam mal dos outros e acabam por relembrar fatos desabonadores do próprio defunto.

— Dimas era um homem interessante e excepcional —. Assim descreve André Luiz a fala de um senhor idoso, que se encontrava em um velório. No entanto, a partir daí o narrador passou a descrever crime cometido há mais de trinta anos, que teria sido testemunhado por Dimas, que preferira manter silêncio a fim de evitar escândalo e enormes dissidências domésticas e sociais.

A conversação desrespeitosa e leviana atraiu a horrível figura do assassino, que ali compareceu para tomar satisfações com o maledicente:

Sou eu o assassino! Que quer você de mim! Por que me chama? É juiz?!

A presença da figura monstruosa conturbou o ambiente do velório, com prováveis reflexos negativos sobre o morto. Em seguida, todo o corpo do irresponsável senhor foi atingido por violento estremecimento, o que provocou risos dos presentes.

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Comentar o mal, relembrar crimes, destacar erros alheios e propagar a maledicência envenenam nosso ambiente, atrai espíritos inferiores e pode nos trazer desagradáveis consequências.

Não é tarefa fácil, pois taxamos de simples comentários ou inocentes fofocas terríveis murmurações que podem contaminar mentes alheias e provocar dissensões e crimes.

No atual estágio evolutivo do homem, quando dois ou mais encarnados dialogam, é muito difícil manter conversação digna por mais de cinco minutos.

Ainda que por conveniência pessoal, não somente por princípios éticos e filosóficos, a indulgência deve prevalecer em nosso comportamento, pois sem ela podemos criar amargas situações.

Fiquemos com a lição de Valérium:

Sempre que os seus ouvidos forem chamados a notar supostos defeitos ou faltas dessa ou daquela pessoa, pense e fale no bem, na certeza de que o mal, seja ele qual for, não é digno de atenção, nem traz proveito algum.

 

Referências: O Evangelho Segundo o Espiritismo e O Livro dos Espíritos, Allan Kardec; Obreiros da Vida Eterna e Nosso Lar, André Luiz; Bem-aventurados os simples, Valérium.