O Princípio Inteligente

Chama-nos a atenção, a quantidade de vezes em que aparece em O Livro dos Espíritos, em versão eletrônica, o vocábulo “Inteligência”. Cento e quarenta e quatro vezes, quando “Amor” aparece oitenta vezes, e “Princípio Inteligente“, que é a definição de Espírito, dezesseis vezes.

O espírito, que é criado simples e ignorante, e que tem como objetivo a perfeição, está inserido na Lei do Progresso, o que significa desenvolver sua inteligência.

O espírito Ferdinando, espírito protetor, em O Evangelho Segundo o Espiritismo, nos fala da missão do homem inteligente na Terra, primeiro nos alertando que por mais que saibamos, este saber tem limites muito estreitos na Terra, e em sequência, que o uso deve ser para o bem de todos.

Mas, o que é ser inteligente?

O Homem tem buscado entender e quantificar a inteligência há muito tempo, mas foi no século XX que as pesquisas e descobertas se desenvolveram.

Em 1905, Alfred Binet e Theodore Simon criaram a Escala Binet-Simon, usada para identificar crianças com deficiência no aprendizado escolar. Baixos resultados indicavam uma necessidade de intervenção mais aprofundada dos professores, mas não significava inabilidade para a aprendizagem. Alcançou enorme sucesso.

Em 1912, Wilhelm Stern propôs o termo “QI” (quociente de Inteligência) para representar o nível mental, e introduziu os termos “idade mental” e “idade cronológica”, e o QI seria determinado pela divisão da idade mental pela idade cronológica. Com o passar dos anos, alguns ajustes ocorreram, e finalmente em 1939, David Wesheler criou o primeiro teste de QI para adultos.

Durante quase todo o século XX o Homem maravilhou-se com o QI, e o utilizou largamente, identificando os mais diversos níveis de inteligência, endeusando, não poucas vezes, os portadores de altas pontuações, alçando-os a posições de destaques na sociedade, nos meios políticos e profissionais, e relegando, quase à marginalidade, os portadores de níveis normais e infranormais, quando não, manipulando-os segundo seus interesses.

Mas, assim como as grandes inteligências provocaram as grandes descobertas, produzindo o progresso tecnológico humano, produziram também catástrofes em larga escala – as grandes e pequenas guerras, por exemplo, produzindo dores e prejuízos sem monta. E todos nós conhecemos pessoas inteligentíssimas que não são felizes, que possuem dificuldade de socialização, e outras simplórias, segundo a escala do QI, que são felizes e fazem os outros felizes.

Deduzimos então, que ser portador de alto índice de QI não é suficiente para dar ao homem o necessário para se sentir completo. Falta-lhe algo mais.

Na década de 1990, surgiu um outro tipo de inteligência, a “Inteligência Emocional”, denominada QE, cujo principal defensor, o norte-americano Daniel Goleman, trabalha a ideia de que o controle emocional contribui para o desenvolvimento da inteligência do indivíduo, e que a situação de violência e criminalidade do mundo de hoje é reflexo da cultura que se preocupou com o QI, esquecendo-se do lado emocional do ser humano. É preciso trabalhar as emoções, corrigindo as reações instintivas, utilizando-as inteligentemente, controlando e evitando as negativas, o medo, a ansiedade e a raiva, que são as piores, e as positivas, a esperança é a maior delas, para viver melhor e produzir mais.

Emmanuel, muito antes, em “Pensamento e Vida”, já nos adverte sobre o controle das emoções, dado o impacto que as mesmas proporcionam ao nosso corpo físico, via períspirito, o que a ciência já tem comprovado largamente.

Segue-se que o QI nos mostra como funciona e como fazer, e o QE nos aponta como nos comportar diante da vida.

Evidentemente, não se trata de tornar-se frio diante dos acontecimentos, mas sim tirar proveito das emoções para viver melhor.

Ainda na década de noventa surgiu a ideia de que homem é portador de inteligências múltiplas, e que todas são passíveis de serem desenvolvidas, embora seja natural a que umas se mostram mais avantajadas do que outras.

Mas é no final do século vinte que aparece, com mais ênfase, a ideia de que o que falta no homem é desenvolver sua inteligência espiritual, para que possa se completar enquanto se humano.

A física e filósofa Danah Zohar desenvolveu amplo trabalho nesse sentido, e talvez tenha se tornado a maior porta voz da “Inteligência Espiritual”, ou QS, em inglês, dizendo que é preciso se questionar se queremos vivenciar esta ou aquela situação, ou seja, se vale a pena enquanto seres humanos talhados para extrapolar a materialidade em direção à subjetividade da moral superior.

A Dra. Danah identifica algumas características das pessoas desenvolvidas ou em desenvolvimento espiritual: praticar o autoconhecimento, não temer as adversidades, pensar no todo, praticar saudavelmente o “por quê?”, ter compaixão, etc.

Para nós, espíritas, essas características não são novidades.

Há cento e cinquenta e três anos a Doutrina Espírita vem nos conduzindo a esse entendimento, apontando-nos como alcançá-lo, explicando-nos os mecanismos da vida, suas leis, baseada na perfeita interpretação do evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo, nas obras de Kardec, e também nas obras subsidiárias.

Não se trata, porém, de abandonarmos o desenvolvimento dos QI e QE, mesmo porque o espírito, enquanto princípio inteligente, caminha, inexoravelmente, à perfeição, o que significa desenvolver-se por completo. É o que podemos inferir da orientação do Espírito da Verdade quando nos aponta o “amai-vos e instrui-vos”, sem nos direcionar a esse ou aquele ponto preferencialmente.

Finalmente, podemos deduzir que ser inteligente, na Terra, é seguir as orientações evangélicas, tais como o perdoar, ceder, socorrer, enfim, trabalhar no Bem e para o Bem, tirando proveito, espiritualmente, de todas as situações em que venhamos experimentar, para progresso de nossos espíritos.

Pensemos nisso.

Antonio Carlos Navarro

Publicado simultaneamente na Agenda Espírita Brasil – www.agendaespiritabrasil.com.br

Originally posted 2014-09-30 00:01:25.