Promessas não Cumpridas
- Colunas
- 18/06/2021
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Sidney Fernandes
Colhendo retalhos de depoimentos de pessoas que passaram a viver no além, concluí que, depois de certo tempo, a maioria reconhece a necessidade de nova encarnação física, em busca de retificação e aperfeiçoamento.
Prometem que vão mudar de comportamento, que aceitarão qualquer sacrifício e aceitarão qualquer dificuldade, tudo para conseguir nova oportunidade reencarnatória.
Assim que aqui aportam, até procuram, inicialmente, cumprir as promessas de realização assumidas. Infelizmente, muitos se deixam seduzir pelos interesses materiais por onde transitam as multidões.
Trago-lhes o caso de Waldemar, que pediu para renascer entre os homens para desenvolver atividades de promoção social junto de crianças e adolescentes carentes. Sua missão seria montar uma escola de tempo integral, em cujo contraturno os alunos teriam noções de línguas estrangeiras, informática, reforço escolar e iniciação profissional.
Gabriel foi o instrutor desencarnado encarregado de lhe dar proteção e apoio para que, no tempo devido, detivesse os recursos necessários à empreitada. Recebeu corpo privilegiado, que mais parecia encouraçado contra quaisquer doenças.
Cedo, através de sonhos e intuições, Waldemar viu-se em contato com Gabriel, que passou a lhe recordar os ideais com os quais havia se comprometido em seu planejamento espiritual. As intuições do anjo protetor encontraram guarida no subconsciente do futuro lidador de tarefas nobres.
Precisava, no entanto, de recursos. Sem dinheiro, o que poderia fazer? E o dinheiro chegou, abundante…. Como se ele tivesse nascido com o Toque de Midas, que, segundo a mitologia grega, proporciona o dom de transformar tudo em ouro, a partir de um simples toque.
Negócios, explorações, transações imobiliárias, lavouras e até loterias proporcionaram vertiginoso progresso financeiro na vida de Waldemar. Casado, o suposto missionário organizou fortuna para a esposa, pais, filhos, sogro, avô e netos.
Chegou o momento de ele cumprir os acordos firmados com os regentes maiores. A criação da instituição benemérita, que tanto bem social iria trazer para a comunidade carente de sua cidade, aguardava as iniciativas do tarefeiro.
Foi nesse ponto que as coisas começaram a desandar.
Gabriel falava em crianças, Waldemar falava em negócios; Gabriel mostrava carências, Waldemar reivindicava mais recursos; Gabriel destacava educação, Waldemar adquiria mais bens; Gabriel falava em diferenças sociais, Waldemar alegava obrigações do governo.
Aconteceu com nosso suposto missionário o que reza a lenda dos “Midas” da atualidade: de tanto identificar-se com os bens materiais, os empolgados com a riqueza passam a fazer parte deles, assim como, no inverso, quem se torna ganancioso e obstinado pelo dinheiro começa a adquirir a fungibilidade do dinheiro. Quem se afasta dos compromissos espirituais, e passa a amar coisas, aos poucos vai se coisificando.
Ensina Emmanuel que, em geral, esses que se empolgam em demasia com os prazeres materiais, e que se esquecem das promessas firmadas na espiritualidade, somente acordam quando a doença ou a morte os abraça. Elas são as enfermeiras da alma, que nos envolvem e nos fazem recordar os pactos firmados, antes de iniciarmos a jornada terrestre.
— Ah! Se fosse possível voltar… — pensam eles.
Qual foi o destino do nosso personagem? — deve estar indagando o caro leitor.
Certa ocasião, ao visitar determinada fazenda, onde iria implantar monopólios de abastecimento, Waldemar, inadvertidamente, não percebeu inocente casca de banana, que se transformou em improvisado patim. Caiu de costas e projetou o crânio em sólido pontiagudo, vindo a falecer imediatamente.
Ao chegar ao plano espiritual, foi recebido e amparado por Gabriel. Depois do abraço inicial de confraternização, ambos passaram em revista os sonhos de mocidade, os projetos sociais e as excelentes condições que Waldemar havia recebido da espiritualidade e que em nada frutificaram em favor das obrigações assumidas.
Waldemar caiu em si e começou a chorar.
— Meu amigo, meu amigo — disse Gabriel à guisa de consolo. Agradeçamos ao Senhor e à casca de banana a felicidade de reequilíbrio. Seu ideal voltou intacto. Esperemos que o berço lhe seja de novo propício.
***
Diz Emmanuel que muitos requisitam a porta estreita e a recebem. Entretanto, acomodam-se com a porta larga. Voltam a integrar o grupo dos ansiosos, que procuram entrar de novo e não conseguem.
***
Previnamo-nos, amigos leitores, contra os excessivos atrativos materiais que podem comprometer nossos ideais mais nobres. Qualquer que seja a tarefa, por mais humilde que pareça, todos somos missionários e temos um planejamento a cumprir. Obedeçamos à voz da consciência, que geralmente nada mais representa do que a advertência e a inspiração de nosso protetor espiritual, para que evitemos as cascas de bananas que podem nos levar ao fracasso de nossos empreendimentos morais.
Referências: Vinha de Luz, Emmanuel; Adaptação da lição A casca de banana, do livro Contos desta e doutra vida, Irmão X; O toque de Midas, de Roberto Tranjan.