A Preocupante Proposta da Pena de Morte

De acordo com resultado de pesquisa do IBGE referente ao censo de 2010 (1), 86,8% da população do Brasil é constituída de cristãos, ou seja, caso esta percentagem se verifique atualmente, algo em torno de 180 milhões de brasileiros alegam seguir os exemplos e ensinamentos de Jesus, considerando a população atual em aproximadamente 210 milhões. O restante de 30 milhões seria formado por outras correntes religiosas não cristãs e indivíduos não religiosos.

Estes números seriam tranquilizadores em relação ao nosso futuro, pois se toda esta gama da população brasileira estiver seguindo realmente o Cristo, praticando e vivendo os Seus exemplos, o futuro do país estaria assegurado em termos de conduta ética e moral considerando seus habitantes.

Entretanto, recente pesquisa divulgada pelo Data Folha (2), sobre a questão da pena de morte, apontou um dado intrigante sobre este tema, porquanto, registrou uma percentagem de 57% dos entrevistados a favor da pena capital. Aplicando este percentual ao contingente de brasileiros, seriam cerca de 120 milhões defendendo a aplicação desta pena.

Se considerarmos o número de não cristãos, por volta de 30 milhões, como indicado anteriormente, religiosos ou não, votando todos em uníssono a favor da pena capital, ainda assim, teríamos um contingente por volta de 90 milhões de cristãos desejando a implantação desta penalidade.

Todo aquele estudioso e atento leitor da mensagem do Cristo, já entendeu ser Jesus totalmente contrário a qualquer ato de violência seja contra quem for. A tônica cristã sempre foi caracterizada pela brandura, pacificação e misericórdia, jamais incitou alguém a revidar ofensas, muito menos tirar a vida do semelhante em nome de qualquer modalidade de uma suposta justiça.

Como se não bastasse, o Mestre expressou claramente a proposta de não ter vindo para destruir a lei antiga, mas dar-lhe cumprimento, quando disse (3): Não penseis que vim revogar a Lei e os Profetas. Não vim revogá-los, mas dar-lhes pleno cumprimento, porque em verdade vos digo que, até que passem o céu e a terra, não será omitido nem um só i, uma só vírgula da Lei, sem que tudo seja realizado. (Mateus 5:17-18).

E mais, quando os representantes do Sinédrio se dirigiram ao Horto das Oliveiras para prendê-Lo e Pedro, em um ato instintivo desembainhou sua espada e feriu Malco, um empregado do sumo sacerdote integrante daquela comitiva, em uma tentativa de defender o Meigo Rabi da Galileia, Este de pronto lhe advertiu (4): Guarda a tua espada no seu lugar, pois todos os que pegam a espada pela espada perecerão. (Mateus 26:52)

Sendo assim, como compreender tantos cristãos terem respondido afirmativamente o questionamento sobre a implantação desta condenação máxima? O quinto dos dez mandamentos de Moisés é cristalino, e Jesus o ratificou plenamente pelos exemplos que nos deixou: Não matarás. Não há nenhuma abertura na compreensão deste mandamento, sugerindo a possibilidade de se aplicar o olho por olho, o mandamento é absoluto. Esta última proposta moisaica, totalmente extemporânea, serviu como medida provisória e paliativa para tempos turbulentos vividos pela comunidade judaica de então.

É inquietante observar cristãos concordando com uma medida que autorizaria acabar com a vida de um semelhante, exatamente o bem maior de todos nós: a vida, tentando fazer “justiça” com as próprias mãos.

E sobre esta alegada justiça, perguntamos: Como esta seria feita se a proposta é matar o ofensor, o transgressor da lei? O criminoso morto não devolve à sociedade o que lhe tirou, tampouco compensa o prejuízo causado pelo crime cometido, seja ele qual for.

Esta medida é extrema e ilógica, na medida em que, se a sociedade julga ter o criminoso uma dívida a pagar, precisa ressarcir aquilo que lesou, mantenha-se o transgressor da lei trabalhando em prol desta comunidade, o tempo que se julgar necessário, sob a supervisão desta mesma sociedade até que, segundo os padrões ou leis vigentes da época, o ressarcimento seja alcançado.

Não faz qualquer sentido tirar a vida de um criminoso, pois, assim o fazendo, ele em nada compensou o dano cometido à sociedade. O raciocínio é baseado no ponto de vista materialista, quando prevê ressarcimento material ao lesado segundo critérios estabelecidos pela própria sociedade.

Por outro lado, não há necessidade de fazer uma avaliação se esta medida é eficiente ou não, considerando o ponto de vista materialista, porquanto, sabemos não ser efetiva, há dados concretos comprovando a ineficácia da medida em diminuir os índices de criminalidade onde e quando foi aplicada ao longo de nossa história.

Ajuizando a matéria um pouco mais humanisticamente, durante o tempo de aprisionamento, o transgressor poderá refletir detidamente sobre o seu ato, quem sabe buscando uma renovação pessoal na forma como vem participando dentro do grupamento social. Ele igualmente poderá estudar, ler, se ilustrar com conhecimentos novos, há presídios com infraestrutura viabilizando estas possibilidades, podendo ganhar, também deste modo, entendimento diverso daquele que detém sobre o inquestionável valor de uma vida.

Pela ótica religiosa cristã é um total absurdo, um contrassenso, um atentado aos princípios cristãos: recuperar o olho por olho de Moisés!? Matar por vingança, para se sentir intimamente recompensado!? Seria esta a proposta exemplificada por Jesus?

Não cremos. Se, de fato, os entrevistados ao se dizerem seguidores do Cristo, na pesquisa realizada sobre o credo religioso, o fossem realmente, jamais cogitariam em expressar qualquer vontade ou desejo no estabelecimento da pena de morte.

Não se segue Jesus parcialmente, ou seja, aceito algumas bem-aventuranças, me agradam os exemplos do Mestre, aspiro a ser como o Cristo, contudo, se me atingem ou aos meus afeiçoados, preciso me vingar e, pelo olho por olho, aceito tirar a vida do criminoso.

Alguém já disse: há muitos cristãos sem Cristo; parece-nos ser este tema em exame um dos casos aplicáveis a esta máxima.

Rogério Miguez

Fonte: Agenda Espírita Brasil