Uma Cachorrinha muito Especial – por Sidney Fernandes
- Colunas
- 23/05/2019
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Mafalda não sabia mais o que fazer com sua filha Luciana, que estava perdidamente apaixonada por Mário. A mãe prestimosa sentia que o rapaz não era pessoa confiável, nem tinha profissão definida.
Por outro lado, Mafalda tinha perfeita consciência de que, às vezes, os planejamentos da espiritualidade destoam dos ideais preconizados pelos homens.
— Será que Luciana tem algum compromisso espiritual com Mário? — pensava.
Ela já havia lido, em obras espíritas, que não raramente filhos precisam de condições mais severas de vida, para rever procedimentos negativos do pretérito.
Esqueci de lhe contar, caro leitor, que além do amor da sua vida, que ela considerava ser Mário, Luciana tinha outro amor: Xuxinha, cachorrinha filhote de maltês, de pequeno porte, que só faltava falar. Companhia inseparável, Xuxinha era a salvação da jovem, nas tardes de domingo em que Mário saía com os amigos e a deixava só.
Coração de mãe, no entanto, não descansa enquanto os filhos não estejam bem encaminhados. E foi assim que Mafalda passou a orar com veemência, buscando a ajuda de seus mentores maiores. Se fosse melhor para a filha — orava resignadamente Mafalda —, que ela fosse feliz ao lado do traste que havia encontrado. Se, todavia, ela estivesse desviada da sua verdadeira trajetória espiritual, que a espiritualidade interviesse, antes que fosse tarde demais.
E foi assim que uma inesperada tragédia aconteceu. Um pet shop enganou-se na dosagem de inseticida e Xuxinha partiu desta para melhor: morreu! Luciana se viu perdida num mar de emoções. E foi nessa hora que Mário se revelou, mostrando sua falta de sensibilidade. Abandonou a namorada, deixando-a com suas lágrimas inconsoláveis.
— Eu, hein — justificava-se Mário —, ficar pajeando uma mãe de cachorrinha desconsolada? Vou cuidar da minha vida.
Inteligente, mesmo afogada em seus sentimentos pela perda da cachorrinha, Luciana logo raciocinou que, se enquanto solteiros ela não poderia contar com Mário, muito menos depois de casados, em situações mais graves.
Foi quando surgiu Alexandre. O colega de trabalho de Luciana estava esperando uma oportunidade para demonstrar sua admiração por ela. O rapaz, espertamente, apareceu, no momento mais crítico da mágoa da moça, portando uma gêmea de Xuxinha. E mais, Alexandre revelou-se o apoio fundamental, para que Luciana superasse aquela crise.
Hoje — pois estes relatos datam de alguns anos atrás — Luciana está casada — e muito bem casada, conforme atesta sua mãe. E o principal: Alexandre, além de ajuizado, colocou Luciana na linha, levando-a de volta à religião, que ela havia abandonado por causa de Mário.
Ponderada, Mafalda jamais revelou o conteúdo de suas orações para ninguém. Até que um indiscreto espírito contou toda a história, em psicografia espontânea:
— Não havia outra maneira de abrir os olhos de sua filha, Mafalda, se não aproveitássemos o acidente com a cachorrinha. Não fomos os responsáveis pela morte do animal, apenas nos valemos da circunstância.
Foi nesse momento que Mafalda entendeu como às vezes age a espiritualidade maior, quando precisamos de sua interferência. Pensamos, muitas vezes, que nossas preces não foram atendidas, quando, na verdade, os anjos de guarda agiram diferentemente do que esperávamos, e tão discretamente, que nem percebemos. Confiemos sempre!